Desde dezembro de 2022, as chuvas estão cada vez mais severas e as previsões são de que essa “atipicidade” siga até abril.
Por: Marcellus Campêlo
O inverno amazônico, como é conhecido popularmente o período que vai de novembro a maio, é caracterizado pela intensificação das chuvas, o que vem ocorrendo, só que se manifestando acima do volume esperado.
O mês de fevereiro ultrapassou a marca esperada para o período, segundo dados do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET). A média histórica do volume de chuvas no mês, cerca de 297 milímetros, foi superada. Até o dia 27, o INMET já contabilizava 424,3 mm.
Somente no dia 16 de fevereiro, choveu 86,6 mm em Manaus, quase 30% da média esperada para o mês. Algumas regiões da cidade, como as zonas sul e centro sul, atingiram, respectivamente, índices pluviométricos de 97 mm e 103 mm. Para se ter uma ideia, é classificada como normal a quantidade que varia entre 15 mm e 30 mm por dia. Acima de 50 mm já é intensa, com emissão de sinais de alerta pelo serviço de meteorologia e Defesa Civil. Acima de 100 mm é caracterizado como anormal.
Os fortes temporais que caem sobre a cidade têm causado estragos, principalmente nas zonas norte e leste, felizmente sem vítimas fatais. Este ano já foram registradas mais de 420 ocorrências, entre alagações de ruas, deslizamentos de terra e desabamentos de casas construídas em áreas de risco. O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) informou, recentemente, que Manaus está entre as capitais com maior alerta de risco de deslizamentos, o que demonstra que os eventos não são fatos isolados.
Alguns fatores têm influência direta nas alagações provocadas pelas chuvas. Entre eles, está a intensificação dos eventos climáticos extremos, com chuvas atípicas acima da média, tanto na capital amazonense como em outras cidades e países. Um exemplo é a tragédia ocorrida no litoral de São Paulo, com cidades fortemente castigadas pelas chuvas, num cenário desolador, com vítimas fatais, centenas de famílias desabrigadas e rodovias interditadas.
No caso de Manaus, tem ainda o processo de expansão desordenada da cidade, com ocupações irregulares que foram ocorrendo ao longo dos anos. Contribui, ainda, a falta de manutenção do sistema de drenagem, aliada ao descarte incorreto dos resíduos pela população, causando o entupimento das galerias e prejudicando o escoamento das águas pluviais.
As alagações têm se mostrado, portanto, um grande desafio para o sistema de drenagem da cidade, problema que começa a ser enfrentado pela atual administração municipal. Na região do centro de Manaus, a envoltória do Igarapé do Mestre Chico, onde tem obras do Programa Social e Ambiental de Manaus e Interior (Prosamin), o impacto é grande e vindo de outras partes da cidade. Como está no final da bacia, toda a água que vem das áreas à montante para desaguar no Rio Negro passa pelo sistema de galerias e pelo canal construído pelo Prosamin. E vem carregada de lixo, detritos e terra, comprometendo a eficiência do sistema de drenagem em alguns pontos.
Obras emergenciais estão sendo feitas pelo Estado, em apoio à Prefeitura, visando à manutenção, recuperação, melhoria e adequação do sistema naquela área. Entre as ações, estão a limpeza das galerias, das caixas coletoras e bocas de lobo que estão obstruídas por lixo, e reparos na estrutura do canal até o desemboque.
A Unidade Gestora de Projetos Especiais (UGPE), responsável pelo Prosamin, está realizando um diagnóstico completo da situação, para verificar quais são as redes do município que impactam no local e se há a necessidade de outras intervenções, como a construção de uma linha de drenagem auxiliar na área do Parque Residencial Mestre Chico. É importante também reforçar o trabalho voltado à educação ambiental, de conscientização dos moradores para o descarte correto dos resíduos.
O Governo do Estado já construiu, ao longo das etapas do Prosamin, 44,5 quilômetros de rede coletora de águas pluviais e 14,2 quilômetros de macrodrenagem (galerias e canais), obras realizadas nas bacias de Educandos e do Quarenta, na zona sul, e do São Raimundo, na zona oeste; substituiu áreas alagadas ou sujeitas alagação por parques urbanos, praças, ruas e outros equipamentos.
Cerca 80 mil pessoas que viviam em situação de risco às margens desses igarapés foram reassentadas em moradias adequadas.
O programa também implantou 222 quilômetros de rede de coleta de esgoto, seis estações elevatórias e uma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE), que permitiu um salto de qualidade na cobertura de esgoto em Manaus, serviço que é gerenciado pelo município, mas que conta com a atuação forte também do Estado.
Como fruto dessa parceria, foi assinado em 2016 o Termo de Convênio de Cooperação Técnica n. 004/2016, que parametrizou a entrega das obras relativas aos sistemas de distribuição de água e esgotamento sanitário, realizadas nas fases I, II e III do Prosamin. Da mesma forma, efetuou o repasse das edificações construídas ao município de Manaus, por meio de seus órgãos competentes, para realizar a gestão, manutenção e operação desses espaços.
Não resta dúvida que as obras realizadas pelo Prosamin têm sido de grande importância para a cidade, ampliando a cobertura de saneamento básico. Os impactos se veem até mesmo na saúde. Estudo feito pela Fundação de Vigilância em Saúde (FVS) mostra, por exemplo, que na área da bacia do São Raimundo a incidência de verminose em crianças em idade escolar reduziu de 43% para 17,27% após as intervenções do programa. Um dado a ser comemorado.
Daqui para diante, é preciso pavimentar esse caminho que já começou a ser construído e, tanto o Governo do Estado quanto a Prefeitura estão cientes disso e trabalhando para que a cidade de Manaus seja efetivamente preparada para o futuro. Isso inclui evitar novas invasões, garantir a manutenção do que foi construído e ampliar ainda mais os serviços.
Marcellus Campêlo é engenheiro civil, especialista em saneamento básico; exerce, atualmente, o cargo de coordenador executivo da Unidade Gestora de Projetos Especiais (UGPE) do Governo do Amazonas.
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